Os historiadores concordam que os quadrinhos nasceram no século XIX, junto com o auge do Jornalismo na Europa e na América. No entanto, alguns acreditam que as revistinhas japonesas nasceram bem antes, no século XI, quando surgiram as primeiras imagens de humor em pergaminhos.
Por volta de 1700, diferentes formas de imagem começaram a surgir até chegar aos ukiyo-e, gravuras que eram feitas em pranchas de madeira. Um dos mais famosos artistas de ukiyo-e da época, Katsuhika Hokusai, resolveu desenhar imagens em sucessão e encaderná-las. A esse livreto ele deu o nome de man (“involuntário”) e ga (desenho), que passou a significar “desenhos involuntários”. Depois disso, o termo mangá (como escrevemos em português) virou sinônimo de tudo que é relacionado a humor com imagem, como a palavra cartoon, em inglês. O criador do termo “mangá” foi Hokusai, mas o primeiro autor japonês, na verdade, foi Rakuten Kitazawa, que criou a primeira história em quadrinhos com personagens fixos.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, a produção de mangás no Japão, que ia bem desde os primeiros quadrinhos de Kitazawa, começou a perder ritmo, não só pela falta de papel, mas também pela censura. As únicas publicações na época eram propaganda em prol da guerra, frequentemente mostrando os países inimigos como pouco menos que terríveis vilões.
Terminada a guerra, a indústria de quadrinhos japonesa precisou começar tudo de novo, do zero. Neste momento, o país mais do que nunca precisava de entretenimento para esquecer as marcas da derrota. E é nesta hora que entram em cena dois elementos que vão contribuir para trazer o mangá à tona com força total. Um deles foram os kamishibai, ou “teatros de papel”, que eram grupos de teatro que saíam às ruas para encenar histórias que haviam sido publicadas em quadrinhos. O segundo elemento, e o mais importante para a popularização do mangá, foram os kashibon manga, que eram as “gibitecas”, como chamamos aqui no Brasil.
Como na época a indústria dos mangás estava falida, cada edição publicada pelas editoras saía a um preço muito elevado e acabava vendendo pouco. Para ajudar os fãs, as “gibitecas” passaram a alugar mangás a preços muito baixos (equivalente ao que hoje seria R$ 0,30 um aluguel).
Após o fim da guerra, os Estados Unidos, com medo do fantasma do comunismo, resolveram tornar o Japão uma colônia a sua imagem e semelhança. Resultado: cultura e costumes foram lançados sobre o Japão e o mercado econômico voltou a abrir suas portas. É então que entra em cena Osamu Tezuka, chamado pelos japoneses de “Deus do mangá” e “pai da narrativa”. Fã dos desenhos da Disney e do cinema de Hollywood, Tezuka resolveu introduzir nos mangás estilos e características diferentes e dinâmicos que acabaram fazendo um enorme sucesso para o público recém “americanizado”.
Daí em diante, o sucesso dos quadrinhos foi um efeito dominó. Como as “gibitecas” abriram os olhos das editoras para o que a massa queria ler, em 1947 pôde surgir a primeira publicação exclusivamente sobre mangás. A revista, de mais ou menos 200 páginas, falava sobre desenhos, tendências, curiosidades e incluía no encarte capítulos aleatórios de autores de mangás. Era permitido apenas um capítulo por autor, ou seja, uma revista vinha com capítulos de 15 a 20 histórias diferentes. Isso, dependendo da história, estimulava o leitor a querer comprar a revista na próxima semana para saber o restante da trama.
xadrez A novidade virou moda e muitas editoras lançaram suas próprias revistas, que, por sua vez, davam espaço a autores desconhecidos e diferentes. Ora, então para que um mangá tivesse a chance de ser lido pelo público não precisava ter dinheiro para encaderná-lo e publicá-lo e, sim, conseguir que alguma revista especializada publicasse um capítulo? Exatamente. Se a história fizesse sucesso, ao final de 200 ou 300 páginas de capítulos publicados o autor era convidado por uma editora a publicar seu primeiro livreto encadernado. E assim surgia o primeiro número de seu mangá. Hoje em dia, algumas histórias fazem tanto sucesso que passam dos 100 volumes de 200 páginas.
Todo esse esquema de publicação de mangás no Japão gerou uma economia interessante. Cada revista especializada em mangás era impressa em papel jornal e em preto e branco, ou seja, descartável. Leu, jogou no lixo. Não fazia sentido produzir as revistas em alta qualidade porque seria impossível arquivar todas as publicações que saíam em um mês no país, dada a enorme quantidade de papel e o pouco espaço que as pessoas já tinham.
Algumas edições de mangás trazem a primeira página em papel de alta qualidade e colorido, mas são raras. O japonês, com isso, não é estimulado a guardar papel em casa. Esse formato acaba explicando também o preço baixo das revistas. A maioria custa o que aqui no Brasil sairia a R$ 2,50 o livro de 200 páginas. Resumo: entretenimento barato.
Firmada a febre das revistas especializadas em mangás, autores e editoras tiveram apenas que seguir o fluxo. Muitos autores criando novas histórias significava a consolidação de novos gêneros, como os adultos. Em 1956, os mangás adultos começaram a ganhar força. As revistinhas dedicadas ao público infantil já vinham fazendo sucesso, mas foi só então que histórias mais dramáticas e profundas começaram a ganhar espaço nas editoras.
Enquanto, na mesma época, os Estados Unidos viviam o Comics Code (aquele modelo em que os quadrinhos tinham que ser voltados para crianças), a tendência de mangás adultos passava a ser aceita e era possível ver cada vez mais histórias realistas, violentas, tensas, obscuras e maduras nas bancas. Hoje, há gêneros de mangás para cada sexo, faixa etária e ocupação, com revistinhas semanais que atingem tiragem de milhões de exemplares por número de edição: uma média de 15 publicações per capita. Há mangás policiais, sobre máfia, de ficção científica, fantasia, romance, história, esportivos, sobre trabalho, comédia, guerra, eróticos, undergrounds, alternativos etc.
Atualmente, os mangás dos autores mais famosos no Japão são traduzidos regularmente para várias línguas: português, inglês, espanhol, francês e outros idiomas europeus. O fenômeno mangá e sua aceitação pelo mundo foram muito maiores do que o ocorrido com as revistinhas americanas. Mundialmente, a indústria de mangás movimenta bilhões por ano. Hoje, só no Japão são cerca de 130 editoras e mais de 300 publicações periódicas sobre mangás, o que representa aproximadamente 40% de toda a produção editorial do país. A Shonen Jump, uma das mais famosas revistas de mangás do Japão, chegou a produzir 6,5 milhões de exemplares por número em 1998, mais de cinco vezes a tiragem da revista Veja na mesma época. Crises econômicas à parte, o mangá é sem dúvida uma febre lucrativa no Japão.
Namastê!
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